O
ato de andar em uma passarela lotada de gente visto por mim como algo normal
não o é... Afinal, quando você anda desligada está “dando mole”, quando você não
imagina que as pessoas em sua volta podem ser um ladrão em potencial você está “dando
mole”, quando você carrega sua mochila nas costas você também está “dando mole”.
O
cara estava andando bem próximo a mim, eu o percebi até porque ele pisou no meu
chinelo. Na primeira vez, eu apenas o achei mal educado por não pedir “desculpa”
e continuei andando rápido, como de costume. Novamente outra pisada em meu
chinelo, estranhei, mas pensei: “não vale apena se estressar”. Já tinha subido
a passarela e ele ainda estava por perto, pisou novamente em meu chinelo e logo
depois parou fingindo olhar o preço de uma mochila...
Imediatamente
eu notei que minha mochila estava aberta, conferir e percebi que o celular não
estava mais lá. Eu poderia ter virado para trás naquele momento, afinal o cara
ainda estava por perto; eu poderia ter gritado “ladrão” e esperar que alguém desse
um corretivo naquele bandido; eu poderia ter feito algo para recuperar meu
celular... Mas eu nada fiz. Fechei a mochila, com a
certeza que não tinha mais meu celular, e continuei andado.
“Tu
é muito lerda mesmo, Barbara.” “Deu molinho.” “Mas se você percebeu porque não
fez nada?”
Sei
lá, eu devo ser uma boba mesmo... Mas a primeira coisa que pensei foi: “Era
apenas um celular.” Acho que eu faço jus ao significado do meu nome, sou estranha
mesmo e certamente sou estrangeira nesse mundo.
De
todas as reações que eu poderia ter no fim eu, provavelmente, estaria agora com
meu celular. Mas o que veio na minha mente naquele momento foi uma cena de
violência... A população anda se achando “justiceira”, afinal quem rouba merece
apanhar e eu não consigo me imaginar sendo pivô de atos assim. Mas, mas e
mas... Eu nunca vou achar que violência se paga com violência!
Há
quem estranhe eu ter ficado tranquila, ter contado essa história rindo e pouco
tempo depois estava eu passando novamente pela mesma passarela. A verdade é
que eu não acho normal andarmos com medo pelas ruas, desconfiarmos de todo
mundo, sermos agressivos... Eu não pretendo ser e nem agir assim. Eu não tenho
culpa quando alguém furta meu celular!
Eu
tenho visto a violência aumentando de forma assustadora, mas o que me assusta mesmo
é que estamos achando isso normal e por isso temos criado “mecanismos de defesa”.
Por exemplo, hoje quando um assaltante é identificado na rua, os trabalhadores,
“pessoas do bem” facilmente param para “dar um corretivo” enquanto esperam a
polícia (isso quando chamam a polícia). Hoje se há uma oportunidade de “se dar
bem”, as “pessoas do bem” facilmente se corrompem... Isso realmente me assusta!
Estamos
vivendo uma inversão de valores e a vida está cada vez mais desvalorizada. A nossa
justiça é corrompida, o nosso senso de justiça está carregado de experiências ruins
e por isso precisamos “jogar” isso em alguém.
Quando
cheguei em casa estava realmente pensando “dei mole”, mas depois pensei melhor.
A culpa não foi minha, a culpa não é da vítima. Errado é o ladrão! Pensei em
tudo que tinha acontecido... E enquanto alguns lamentavam por eu ter perdido o
celular e lamentei ao pensar que muitos estão caminhando cada vez mais longe de
Deus e cada vez mais perto de uma morte eterna... Eu só perdi meu celular.
Fiquei
chateada, perdi muitos contatos, meus aplicativos, vou ficar um tempo sem ficar até
tarde conversando e sem ler a noite pelo celular... Mas foi apenas um celular!